Fá Sustenido

Nesse ar claustrofóbico da solidão
A qual me ponho em dispor total,
Ausências cada vez mais presentes reavivam
Sofrimentos e dores inconscientes,
Imagens de uma morte dolorosa, um olhar seco e vazio.
Quando as frases trabalhadas dos poemas fúnebres e antiquados
Me atingem em sua força magna,
Ajoelho-me no colapso do meu peito, nessa fisgada interminável
Essa ansiedade pelo vazio do futuro,
Todas as lágrimas que insistem em não cair,
Se acumulam em um coração demasiado cheio, de dúvidas e emoções,
Que balbucia batidas tímidas.
Ah, que saudade das batidas rápidas de quando eu te vejo.

Essa imagem tão torturante me atormenta.
Aquele olhar perdido em sofrimento,
Que aguardava o completo falecimento.
Pai, onde estavas naquele momento,
Se não perdido em trevas de tormento?
Dói, como se em carne minha, aquele olhar.
Me confortaria a certeza de um alívio teu.

Qual a ponteiro lento a caminhar
Pelo relógio na parede,
Vou tropeçando aos poucos,
Na minha própria reclusão.

Sinto falta, de amigos e da esperança idiota,
De receber ligações inesperadas às oito da manhã.
Sem pânico, é só mais uma recaída.

Posted at às 01:42 on 29/08/2010 by Postado por Forbidden | 0 comentários   | Filed under:

Far

Pai, cujas palavras rarearam no que antecedia tua morte,
Desejo uma casa pequena e bastante cheia, de amigos, amantes e palavras
Aonde quer que tu esteja, para que no dia em que nos encontremos
Eu te veja como sempre esteve, rodeado do desejo de mudança e do espírito de revolução.
Aposto que tu já te filiaste ao partido socialista do paraíso,
Ou mesmo desafiaste o governo do Plano Astral com teu dócil anarquismo.
Esse amor, que tu me ensinaste capaz de destruir as políticas mais revolucionárias;
Me ensinou a entender o teu carinho e teus propósitos.
Meus filhos hão de conhecer o avô, nos gestos e pensamentos que impregnaste em mim.

Só lamento que meus filhos nunca possam ouvir da tua boca as origens da vida e do universo,
Que me ensinaram a crer na verdade da ciência, da história e da linguagem.
Mas ciente da tua presença e do destino ao qual todos nos dirijimos,
Nenhuma lágrima derramo, mas nem por isso não me sinto sem uma parte de mim.
Não lamente-se pelo que eu sinto, pois que sinto no máximo o pesar de ter uma vida inteira pela frente até reencontra-lo.
De sofrimento e de tristeza, nada deixas,
Ainda assim, leva consigo a intolerância, unindo amigos e família nas memórias de sua representativa vida.

Desejo paz, e saudoso fico, mas não por perde-lo, pois o perder não perderei jamais.

Resta em um simples repousar de mãos, a lembrança constante.
Resta a sensação de que nada aconteceu, já que pouco havia antes.
Restam ossos sob a terra, e restam olhos sem teu semblante.

Adeus, pai.

8/8/10

Posted at às 01:26 on 12/08/2010 by Postado por Forbidden | 1 comentários   | Filed under:

Bêbados

Inspiro o ar etílico dos bafos da esquina,
Que se aproxima tão sedutora.
Revejo no copo a expressão intimista dos animais,
Que viviam em seu colo, me enciumando,
E entrelaço pernas em imundícies urbanas.

É no olhar embriagado que encontram conforto,
Na poesia das roupas rasgadas e do chão sujo.
Na fumaça que respiram,
na sede alcóolica que transformam em riso,
Nas nuvens de águas calmas em um céu de turbidez.

Apesar do beijo incômodo ao pé do ouvido,
E aquele ar impuro tomando conta dos meus pulmões,
O abraço puro e o olhar estrábico denunciam
A pureza de um agir inconsequente,
Que ciente de todas as punições trivias da existência
Totalmente responsável, prefere o tardio porre pubescente
Que só termina sob portas de latão e chuva fina.

Invejo essa alegria insensata,
Muito mais consciente que atitudes calculadas.
Aguardam a manhã fria confortáveis,
No berço pútrido do asfalto,
Gemem de gozo pelo acalento do torpor,
Que termina no raio de sol que os invade as pálpebras.

Felicidade do não-pensar, da ignorância voluntária,
Abraça a tua prole e dá-lhe abrigo.

Posted at às 01:47 on 03/08/2010 by Postado por Forbidden | 1 comentários   | Filed under: